A Urgência do Cadastro de Apicultores nos Órgãos de Defesa Animal
Por Jeovam Lemos Cavalcante
Presidente do Instituto Brasileiro de Apicultura e Meliponicultura – IBRAM
Membro da Câmara Setorial do Mel – MAPA
A apicultura brasileira, embora estratégica para a agricultura e para a conservação ambiental, ainda enfrenta obstáculos estruturais que comprometem seu pleno desenvolvimento. Entre os principais entraves está a ausência de um cadastro técnico e integrado dos apicultores e meliponicultores junto aos órgãos oficiais de defesa animal dos estados.
Um Vazio que Compromete Toda a Cadeia
Segundo dados do IBGE (Produção da Pecuária Municipal), o Brasil produz anualmente cerca de 50 mil toneladas de mel, das quais mais de 90% são destinadas à exportação. No entanto, grande parte dessa produção é realizada por apicultores familiares não cadastrados nos sistemas oficiais, o que os impede de acessar políticas públicas, programas sanitários, linhas de crédito, certificações e até mercados formais de venda.
Essa informalidade torna invisível a maior parte dos produtores diante dos órgãos de vigilância sanitária, dificultando, por exemplo:
– A rastreabilidade da origem do mel;
– A fiscalização adequada das práticas de manejo;
– O acesso a incentivos como o Programa de Aquisição de Alimentos (PAA) e o Programa Nacional de Alimentação Escolar (PNAE).
O Papel dos Órgãos de Defesa Animal
Cada estado brasileiro possui um serviço estadual de defesa agropecuária – como a ADAGRI no Ceará, a ADEPARÁ no Pará, a AGED no Maranhão ou o IMA em Minas Gerais. Esses órgãos são responsáveis por registrar os apicultores, emitir o número de controle sanitário dos apiários, orientar sobre manejo sanitário e realizar a vigilância de doenças como loque americana e outras enfermidades apícolas.
Apesar disso, a maioria dos estados ainda não possui sistemas eficientes ou protocolos específicos adaptados à realidade da apicultura familiar, criando barreiras adicionais à formalização do pequeno produtor.
Caminhos para a Mudança
Diante desse cenário, o IBRAM propõe três medidas imediatas:
1.Campanhas estaduais de mobilização e cadastro apícola, em parceria com as Federações de Agricultura, Federações de Apicultores, Serviços de Defesa Animal e órgãos de assistência técnica, como a EMATERCE, no Ceará;
2.Criação de módulos simplificados de registro, voltados à apicultura familiar, dentro dos sistemas estaduais já existentes;
3.Integração nacional dos cadastros, com apoio do MAPA, possibilitando o cruzamento com os registros ambientais e fiscais, além de promover uma comunicação efetiva sobre o uso de agrotóxicos.
Fortalecimento Federativo e Cooperação Institucional
Como reforço a essa agenda, é importante destacar que a Confederação Brasileira de Apicultura (CBA), entidade representativa das federações estaduais, está em fase final de articulação para reestruturar sua base institucional e apoiar a regularização de federações e associações atualmente inativas por falta de recursos.
Em diálogo recente com o presidente da CBA, Sérgio Farias, foi entabulado um modelo para a instalação de sede definitiva da Confederação em Brasília, com o objetivo de garantir maior presença institucional junto aos órgãos deliberativos ligados à apicultura. Hoje, conforme o estatuto da entidade, a sede acompanha o domicílio do presidente eleito. A proposta – que será deliberada em Assembleia Geral Extraordinária – prevê a transferência definitiva para o Distrito Federal, facilitando a governança e a celebração de contratos nacionais.
Reconhecimento da Origem e Vantagens do Cadastro: o exemplo do Mel de Aroeira dos Inhamuns
A recente conquista daIndicação Geográfica (IG) para o Mel de Aroeira dos Inhamuns, extraído nos municípios cearenses de Aiuaba, Arneiroz, Parambu, Quiterianópolis e Tauá, reforça a importância de se avançar na organização sanitária e produtiva da apicultura brasileira.
Concedido pelo Instituto Nacional da Propriedade Industrial (INPI) na modalidade Indicação de Procedência (IP), esse reconhecimento demonstra que qualidade, identidade territorial e rastreabilidade caminham juntas. E nenhum desses atributos é possível sem a formalização do apicultor por meio do cadastro nos órgãos de defesa agropecuária dos estados.
Esse cadastro:
-Garante a origem sanitária da produção, condição indispensável para pleitear selos de qualidade e certificações;
-Viabiliza a participação em programas de fomento, como compras públicas e acesso a mercados diferenciados;
-Facilita a adesão a projetos de Indicação Geográfica, como o que valorizou o mel dos Inhamuns no cenário nacional;
-Contribui para a organização territorial das atividades, promovendo inclusão produtiva e desenvolvimento regional.
O IBRAM reconhece que o exemplo dos Inhamuns é um marco para o semiárido cearense e para toda a apicultura nordestina. Reafirmamos nosso compromisso de atuar, em parceria com a CBA e os órgãos competentes, para que mais territórios apícolas sejam reconhecidos, valorizados e protegidos.
A ausência de cadastro não é apenas uma omissão burocrática:é um entrave real ao desenvolvimento sustentável da apicultura brasileira. O IBRAM, em convergência com a CBA e demais entidades do setor, atua nacionalmente para construir pontes entre os apicultores e o Estado, visando uma cadeia produtiva mais organizada, segura e valorizada.
Cadastrar-se é proteger-se. É garantir o direito de produzir com dignidade, segurança sanitária e acesso ao mercado. É reconhecer, enfim, o papel essencial das abelhas e de seus criadores na segurança alimentar e na saúde dos ecossistemas. http://www.ibrambrasil.org.br